Belterra, esta cidade ainda pode ser salva

Quando o radialista e advogado Oti Santos foi eleito para ser o primeiro prefeito de Belterra, há 15 anos, logo após aquele distrito ser desmembrado do município de Santarém, conversamos casualmente no aeroporto de Belém sobre idéias para o novo município.
Vila Mensalista, casa típica da arquitetura da Companhia Ford para os
seus funcionários graduados
(Fotos: MD)

Sugeri que se aproveitasse o que restava do espólio da Companhia Ford Industrial do Brasil, como as Estradas, como eram chamadas as ruas, os seringais circundantes e as estações de tratamento do látex, a arquitetura das casas à la norte-americana, tudo isso acoplado ao excelente clima dos 160 metros de altura da cidade em relação ao nível do mar e a proximidade desta com as belíssimas praias do Tapajós, bastando apenas boas estradas para descer a serra e chegar até lá.
Trecho da antiga Estrada 1, via central da cidade. Ainda há flores

Com esse potencial instalado, Belterra precisaria de algumas pousadas e a infraestrutura mínima para receber turistas. Enfim, eu sugeria que Belterra continuasse a ser o que ela era naquele já longínquo 1997. Fora o turismo, disse eu, de que viveria o novo município?
Próximo à prefeitura ainda há bosques de seringueiras remanescentes da
época de Ford, uma amostra dos 3 milhões de árvores que ali houve há 75 anos
Nada disso ou muito pouco se verificou. A implantação do novo município coincidiu com a chegada do desvario da soja, seringais vieram abaixo, o núcleo central de Belterra, cidade hoje com 17 mil habitantes, perdeu o grosso da vegetação e ficou quase sitiado pelos campos de soja e milho. Hoje o calor chama a atenção para a falta de cuidado com o ecossistema amazônico: de cidade de clima ameno e até frio em certas épocas, hoje a ex-“cidade americana no coração da Amazônia” é tão quente quanto as localidade abaixo da Serra do Piquiatuba. Uma pena.
A prefeitura foi instalada em parte do prédio onde funcionava o escritório da
administração de Belterra

Mas algo ainda pode ser feito: manter o pouco que resta dos seringais e transformá-los em atração para tantos visitantes que gostariam de presenciar como se coleta o látex e se produz a borracha. Manter o casario à moda do interior dos USA, que ainda restam, reconstruir a Estrada 1, a Vila Operária, A Mensalista, etc. E reconstruir a história de uma cidade que nasceu dentro de um contexto histórico mundial específico, pois o sentido de Belterra vai além dela própria: ela é fruto da geopolítica de um momento da vida internacional.
A placa amassada parece uma ironia do tempo e do desleixo das pessoas.
Por que não cuidar melhor desse lugar?
Típica residência à moda das construções do Sul dos Estados Unidos.
Restaurada, ainda é residência hoje
A outra extremidade da rua principal de Belterra vai ficando igual às avenidas
de qualquer cidade pequena do Brasil. Somem as flores, vem a desordem.

A seguir, um pouco da história de Belterra
(Fonte: IBGE)

Com a expansão do comércio da borracha, por volta de 1840, iniciou-se uma nova fase de ocupação da Amazônia. Por causa da grande procura pelas seringueiras, quase toda a região foi explorada. A origem do município de Belterra está intimamente ligada a essa época.

O milionário Henry Ford queria transformar seus sonhos em realidade. O objetivo do dono da Companhia Ford, líder na indústria automobilística nos Estados Unidos, era implantar um cultivo racional de seringueiras na Amazônia, transformando-a na maior produtora de borracha natural do mundo.

Nascia, então, a Fordlândia, localizada entre os municípios de Itaituba e Aveiro, que tinha cerca de um milhão de hectares de terras que o governo brasileiro teria cedido à Ford. A vila teria toda a infraestrutura de uma cidade moderna made in EUA. Mas, o sonho não aconteceu, pois a Fordlândia não era uma área propícia para ser base de implantação do projeto. Por isso, técnicos da Holanda e EUA iniciaram intensas investigações para encontrar uma área que fosse ideal para o projeto da Companhia Ford.

A descoberta era perfeita: uma planície elevada às margens do Rio Tapajós, coberta por

densa floresta. A essa área Ford chamou de 'Bela Terra', que depois passou a ser chamada de 'Belterra'. A partir daí, o projeto começava a se tornar realidade, e Belterra ficou conhecida como "a cidade americana no coração da Amazônia".

O projeto teve início e uma estrutura nunca antes montada em toda a região foi dando vida à futura cidade-modelo. Hospitais, escolas, casas ao estilo americano, mercearias, portos próximos à praia foram construídos para abrigar as famílias de todos os empregados que estavam trabalhando no projeto. Grande parte dos trabalhadores braçais vinha do sertão nordestino, fugindo da seca, e encontravam no projeto de Henry Ford a salvação.

Em cinco anos, o projeto ganhou dimensões incomuns para a região naquela época: campos de atletismo, lojas, prédios de recreação, clube de sinuca, cinema. De 1938 a 1940, Belterra viveu o seu período áureo e foi considerado o maior produtor individual de seringa do mundo. No entanto, o final da 2ª Guerra Mundial, a morte do filho de Henry Ford, a grande incidência de doenças nos seringais e, principalmente, a descoberta da borracha sintética na Malásia foram fulminantes para a decadência do projeto em Belterra. A partir daí, a área foi negociada para o Brasil e a Companhia

Ford abandonou o sonho.

Durante 39 anos, Belterra foi esquecida e a "cidade americana" foi transformada, entre outras denominações, em Estabelecimento Rural do Tapajós (ERT), ficando sob jurisdição do Ministério da Agricultura. Em 1997, os moradores de Belterra conseguiram a emancipação do município.

 Formação administrativa
Distrito criado com a denominação de Belterra (ex-povoado), pela lei estadual nº 62, de 31-12-1947, desmembrado de do distrito de Alter do Chão, subordinado ao município de Santarém. No quadro fixado para vigorar no período de 1944-1948, o distrito de Belterra permanece no município de Santarém. Em divisão territorial datada de 1-VII-1960, o distrito de Belterra permanece no município de Santarém. Assim permanecendo em divisão territorial datada de 1-VI-1995. Elevado à categoria de município com a denominação de Belterra, pela lei estadual nº 5928, de 1997.

 Fonte: Blog do Professor Doutor 

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