Tapajós quer romper isolamento e tornar-se 'Estado ecológico'

Com boa parte das últimas reservas florestais intactas do Pará, a região do Tapajós, no oeste paraense, reclama autonomia administrativa para tirar mais proveito de suas belezas naturais.

"Queremos nos tornar o primeiro Estado ecológico do Brasil", diz o deputado federal Lira Maia (DEM), líder da frente pela emancipação da região. A separação do Tapajós, bem como da região sul do Pará (que daria origem ao Estado dos Carajás), será votada em plebiscito em todo o Estado no próximo dia 11.
Segundo Maia, caso seja criado, o Estado dos Tapajós teria 54% de seu território ocupado por reservas indígenas ou florestais. Esse patrimônio ambiental, diz ele, poderia se tornar um pilar da economia do futuro Estado se for explorado turisticamente. "Temos um imenso potencial adormecido."
Hoje, o turismo na região se concentra nas praias de areia branca de Alter do Chão, distrito da maior cidade no oeste paraense, Santarém. As praias, rodeadas pela floresta amazônica e às margens do rio Tapajós, foram consideradas as mais bonitas do Brasil pelo jornal britânico The Guardian, em 2009.
No entanto, diz o deputado, como o aeroporto de Santarém só recebe alguns voos nacionais e a região carece de conexões rodoviárias com o resto do país, há grande dificuldade para atrair um maior número de visitantes e explorar turisticamente outras regiões do oeste paraense.
Com a separação, Maia diz que a região poria fim ao seu isolamento e atrairia mais verbas federais, já que hoje, segundo ele, recebe apenas 5% de todo o valor investido no Pará.
Se for criado, o Estado dos Tapajós abrigaria 59% do atual território paraense, mas apenas 15% de sua população.

Comunidade isolada

A esperança de que a emancipação rompa o isolamento do oeste paraense é a principal razão para que a agricultora Regina de Sousa Meireles, 27 anos, apoie o projeto separatista.
Meireles mora na Vila dos Goianos, comunidade às margens da estrada Santarém-Jabuti.
Embora a vila esteja a cerca de 80 km de Santarém, diz Meireles, a viagem até a comunidade leva cerca de quatro horas, já que a estrada não é asfaltada e está repleta de buracos.
Se chove, porém, a estrada costuma inundar, tornando o acesso a Santarém ainda mais demorado e perigoso.
"Os passageiros vêm de lá para cá correndo risco de vida", diz a agricultora. Segundo ela, muitos ônibus que ousaram fazer a travessia em dias de chuva caíram de uma ponte.
A dificuldade de acessar Santarém, afirma Meireles, faz com que os professores se recusem a lecionar na comunidade, que por isso carece de escolas. De acordo com ela, tampouco há hospitais na região – o mais próximo fica em Santarém.
"Espero que a divisão traga mais recursos para a região".

Corredor para exportação

Além de facilitar o acesso a comunidades isoladas, o investimento em estradas permitira que a região do Tapajós se tornasse um corredor para exportar a soja produzida no Centro-Oeste, segundo políticos locais.
Regina de Sousa Meireles e sua filha (João Fellet/BBC Brasil)
A favor da divisão, Regina espera que região receba mais recursos (Foto: João Fellet/BBC)
Hoje, a empresa alimentícia Cargill já exporta soja pelo porto de Santarém, mas acredita-se que a rota possa ser mais usada caso o asfaltamento da estrada Cuiabá-Santarém seja concluído.
Por outro lado, ambientalistas temem que a melhoria das estradas favoreça o avanço do agronegócio pelo sul da região, ameaçando o meio ambiente.
Eles apontam ainda que, embora hoje o oeste paraense tenha boa parte de suas florestas preservadas, a construção em seu território da hidrelétrica de Belo Monte e de quatro usinas no rio Tapajós (cujo projeto está em fase de estudos) poderia desencadear um processo de ocupação desordenada do território, com graves prejuízos ambientais e conflitos com os indígenas que habitam a região.
Já os defensores da divisão afirmam que a criação do Estado facilitaria a fiscalização do desmatamento e a redução dos danos causados por empreendimentos na região.

Tradições culturais

Outros argumentos usados por partidários da separação são a longevidade do movimento emancipatório (iniciado por volta de 1850) e as tradições culturais únicas da região.
Com muitas cidades fundadas no século 17, quando o interior da Amazônia começou a ser ocupado, a região desenvolveu práticas culturais únicas, distintas das de Belém.
Para o artista plástico Laurindo Leal, 72 anos, a separação evitaria que essas tradições se perdessem, processo que, segundo ele, ocorre a passos largos.
"Cadê o nosso Carnaval, que era um dos melhores do Norte do Brasil? Acabou. No entanto, (com a separação) passaremos a valorizar o que é nosso, e nossa opereta voltaria a funcionar no Natal, assim como outras manifestações folclóricas e culturais".

 Fonte: João Fellet
Enviado especial da BBC Brasil ao Pará

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