O brasileiro que manda no Android

Hugo Barra, um engenheiro de Minas Gerais, coordena o principal investimento do Google para os tablets e os celulares. Como ele chegou lá
TENTATIVA E ERRO
Hugo Barra num evento em San Francisco. Ele estava na equipe do fracassado Google Buzz (Foto: Marcio Jose Sanchez/AP)

O Google entrou numa nova batalha pelo mercado de tecnologia. No dia 19 de outubro, os executivos responsáveis pelo Android, o sistema do Google para smartphones e tablets, apresentaram em Hong Kong a nova versão do programa, chamada Icecream sandwich (sanduíche de sorvete, em inglês). É a primeira capaz de funcionar em qualquer tipo de aparelho: de smartphones e tablets a câmeras, sons de carro, geladeiras e até no espelho do banheiro. O responsável por essa empreitada é o mineiro Hugo Barra. Aos 35 anos, ele é o gerente mundial do Android e um dos nomes mais importantes dentro do Google.

Barra é um dos brasileiros mais poderosos na área de tecnologia no mundo. Em San Francisco, na Califórnia, onde mora, comanda um sistema que anima 190 milhões de aparelhos. Desde o fim do ano passado, é o líder em vendas de smartphones e deverá terminar 2011 com quase 50% do mercado mundial de celulares inteligentes. Com sua equipe de engenheiros, Barra ajuda a definir a forma como usamos a internet, falamos no celular, jogamos, conversamos pelas redes sociais e todas as outras evoluções trazidas com a popularização dos smartphones. Como um brasileiro conseguiu chegar tão jovem a esse posto?

O primeiro motivo é seu entusiasmo por levar seu conhecimento para aplicações práticas. Ele cresceu em Belo Horizonte. Estudou no Colégio Pitágoras, no bairro da Pampulha. “Ficava perto do zoológico. Era uma tranquilidade”, diz. Barra resolveu alçar voo quando começou a graduação em engenharia elétrica na Universidade Federal de Minas Gerais. Um dia, jogando tênis com um colega de faculdade, ouviu falar do Media Lab, o laboratório do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), uma das mais importantes universidades de tecnologia do mundo. “Ele disse que lá seria o lugar ideal para eu misturar o conhecimento de engenharia e design”, afirma. Depois de um ano de estudos e preparação, Barra conseguiu ingressar no MIT. Lá, terminou a graduação e engrenou numa pós.

O segundo motivo do sucesso de Barra é que ele tinha o conhecimento certo na hora certa. Em 2000, quando estava começando a pós, ele e alguns amigos tiveram a ideia de criar uma empresa, a Lobby7, para desenvolver programas de reconhecimento de fala. Na ocasião, o mercado para essa função se limitava a sistemas militares e a alguns protótipos mal-acabados para computadores. Mas o sistema era tão promissor que a Lobby7 foi comprada pela Nuance, uma das principais empresas do setor. Quando os celulares ficaram poderosos o bastante para aceitar comandos de voz, Barra já era diretor da Nuance e tinha tecnologia para executar essa tarefa. Em 2008, ele liderou a criação do primeiro smartphone Android com reconhecimento de voz, um dos recursos mais importantes dos aparelhos atualmente. A operação despertou o interesse do Google naquele ano. Quem o convidou foi outro brasileiro, Mario Queiroz, diretor de produtos de mobilidade do Google. “O Mario saiu para assumir a Google TV e eu assumi o lugar dele”, diz Barra.

No Google, Barra encarou missões ambiciosas. Foi morar em Londres, na Inglaterra, onde fica um dos maiores escritórios da empresa americana. Foi responsável por levar os serviços mais populares do Google, como o Gmail, o buscador e os mapas, para os celulares. Também teve tropeços. Barra foi porta voz do Google Buzz no Brasil. O Buzz foi polêmico desde seu início, pois exibia os contatos mais próximos dos usuários no Gmail. Isso gerou algumas situações constrangedoras, como pessoas que descobriam que seus atuais namorados tinham laços estreitos com ex-casos. O serviço foi desativado na semana passada. O fracasso do Buzz não deteve o crescimento de Barra. Ele foi convocado no ano passado a assumir a gerência do produto mais badalado da empresa, o Android.

Na empresa, Barra é conhecido por ser um chefe que coloca a mão na massa. Faz reuniões semanais com os diferentes núcleos. As equipes que cuidam do Android são pequenas, com cerca de cinco pessoas. A empresa cuida de cada pedaço e função do programa. Barra diz que é difícil separar a vida pessoal do profissional e que pensa 24 horas por dia em “seu filho” robótico. “Ele respira Android”, diz Patricia Correa, responsável pelo marketing do Android para a América Latina. “Trabalhar no Google é do c...”, afirma Barra.

Ele faz parte de um clube seleto de brasileiros talentosos que ajudam a fazer a atual revolução tecnológica. Está no time de inovadores como Eduardo Saverin, cofundador do Facebook; Alex Kipman, criador do game Kinect, da Microsoft; e Mark Krieger, que criou o aplicativo de fotografia Instagram. Se esses sucessos despertam orgulho patriótico, também geram uma preocupação. Por que eles precisaram sair do país para desenvolver seu potencial de criação e de geração de riqueza? Não teriam espaço para crescer aqui?

Para Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, essa modalidade de fuga de cérebros tem dois motivos. O primeiro é o desejo natural dos jovens de querer estudar em outro país. “Não é um fenômeno local. Há muitos jovens americanos estudando aqui na USP”, diz. A segunda razão é a má qualidade do ensino básico brasileiro. Ele tira de boa parte dos jovens com potencial no Brasil a chance de chegar bem formado a uma universidade. Nosso país tem carência de profissionais qualificados. Os países mais ricos e mesmo potências emergentes, como China e Índia, formam 30 vezes mais engenheiros por ano que o Brasil, diz Feldmann. Sem mão de obra no país, as empresas não instalam centros de inovação, pesquisa e desenvolvimento. A burocracia nacional também não protege as inovações. “Jovens empreendedores preferem criar empresas em outros países, com medo de seus produtos serem copiados por outras empresas.” O país ainda precisa trabalhar muito para ter outros Hugos desenvolvendo tecnologia e riqueza aqui.

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