Tapajós e Carajás na Folha

O Pará em pedaços é o título da matéria, feita pela jornalista Vera Magalhães, que o jornal Folha de S. Paulo publicou na sua edição de hoje (10).

A íntegra da matéria, você encontra no Leia Mais, abaixo.

Nela, Vera dá destaque a 2 pessoas envolvidas no processo de criação do estado do Tapajós: Reginaldo Campos (PSB), vereador santareno, e o jornalista e professor Manuel Dutra.

- A Amazônia não se reorganizou territorialmente após a Independência. Há Estados enormes e vazio de poder, graças à centralização. Isso leva a movimentos separatistas. No Tapajós, há o pleito de separação desde o século 19. Há um sentimento difuso de que a vida vai melhorar, mas se você perguntar como, ninguém sabe dizer – explica Dutra numa entrevista à repórter da Folha.

O Pará em pedaços

Debate da divisão do Estado está tão acirrado que será difícil manter unidade se o “não” vencer o plebiscito
VERA MAGALHÃES
ENVIADA ESPECIAL AO PARÁ

Quase dois séculos depois, o Pará reedita a Cabanagem, revolta do século 19 em que índios, negros e mestiços tomaram o poder na então província. Os novos rebeldes querem separar as regiões oeste e sul e fundar os Estados de Carajás e Tapajós.
Antes como agora, o caldo de cultura da insurgência é o sentimento de abandono político e isolamento territorial e a desigualdade econômica entre a capital, Belém, e regiões remotas do interior.

Se em 1835 os rebeldes vinham das camadas mais baixas da sociedade, os “cabanos” de 2011 são empresários, fazendeiros e políticos que conseguiram viabilizar o plebiscito que em 11 de dezembro vai decidir se o Pará será dividido por três.

A Folha visitou as três principais cidades do que será a nova configuração do Estado caso vença a divisão: Marabá, Santarém e Belém.

O que se percebe é que já existe um sentimento arraigado na população das áreas insurgentes pela divisão. Mais: o debate está tão acirrado que haverá dificuldade de estabelecer uma unidade caso o “não” prevaleça.
Mas há diferenças históricas entre os dois projetos de Carajás e Tapajós.

O primeiro é capitaneado por uma elite econômica nova e poderosa, que quer gerir os recursos minerais e a forte agropecuária da região.

O segundo tem maior legitimidade, pois nasceu há 150 anos, mas carece do tônus econômico do vizinho.
Contra ambos estão empresários e políticos da região metropolitana de Belém, que não aceitam perder 86% da área e 44% do PIB.

O governador do Estado, Simão Jatene (PSDB), apontado como contrário à divisão, tem procurado se manter neutro, mas recomenda cautela no debate acalorado.

Ele aponta falhas no projeto de ocupação da Amazônia e desequilíbrios no pacto federativo para dizer que, sem cuidar dessas questões, a divisão não sanará a desigualdade entre capital e interior.

“O Brasil não precisa de mais ou menos Estados. Precisa de Estados fortes, que deem conta das demandas.”

Jatene teme que haja frustração da população caso a separação não leve a resultados imediatos. “Toda vez que a elite acena com algo que não pode oferecer, ela desqualifica a política”, diz.

INÉDITO
Será a primeira vez que, no Brasil, um plebiscito vai decidir sobre a criação de novos Estados, e só agora as regras estão ficando claras. Uma delas foi um revés para partidários do “sim”: a consulta será no Estado todo, não só as regiões que querem se separar.

Os movimentos pró-Carajás e Tapajós ainda esperam que o STF (Supremo Tribunal Federal) reveja essa decisão, mas já articulam uma estratégia de marketing para ganhar votos no que chamam de “Pará remanescente”.

O comandante da propaganda pró-Carajás será o marqueteiro Duda Mendonça, réu no mensalão, que é fazendeiro na região e tem participado de reuniões às quais chega de jatinho.

“O Pará ainda ficará com o grosso dos recursos. Hoje somos uma região rica de povo pobre”, diz o prefeito de Marabá, Maurino Magalhães.

Uma visita ao sul mostra as mazelas de que reclamam os separatistas: estradas esburacadas ligam cidades sem saneamento básico a assentamentos de sem-terra e latifúndios, uma combinação que faz da região uma das mais violentas do país.

“O governo militar incentivou a ocupação dessa região sem contrapartida em políticas públicas. Temos um passivo social e ambiental e uma completa ausência do Estado”, diz o presidente da Associação Comercial de Marabá e membro do movimento pró-Carajás, Ítalo Ipojucan.

Estudo do Ipea mostrou que os novos Estados nasceriam deficitários em cerca de R$ 2 bilhões. Além disso, a nova configuração territorial obrigaria a redivisão de vagas no Congresso e à criação de cargos no Executivo.

Depois da divisão, haverá pressão também pela criação de municípios e disputa para definir as capitais.
Também há dúvidas sobre se Tapajós, sem uma âncora como a Vale do Rio Doce, é viável economicamente. “Temos investimentos como a Alcoa e o Jari, um potencial de ecoturismo e hidrovia”, defende a economista Socorro Pena, que comanda o estudo de viabilidade do Estado.

Primo pobre da cabanagem moderna, Tapajós também não terá nenhum mago da publicidade na campanha pelo “sim”. Aposta num jingle em ritmo de carimbó e em publicitários “da terra”.

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Perfil do vereador Reginaldo Campos:
FOCO
Defensor da cisão quer que filho se chame Tapajós

Reginaldo Campos ficou conhecido com a luta pela criação do Estado e virou vereador
O coordenador do Movimento Tapajós, Reginaldo Campos, em Santarém(PA); ele se dedica à causa desde os 17 anos

DA ENVIADA A SANTARÉM (PA)

Quando Reginaldo Campos descobriu que sua mulher, Rachel, estava grávida do terceiro filho, decidiu: o menino vai se chamar Tapajós. O bebê deve nascer dois meses depois do plebiscito que vai deliberar sobre a criação do Estado, causa à qual o pai dedica sua vida.

Soldado da reserva da Polícia Militar e sociólogo, Campos começou a militar pela criação de Tapajós aos 17 anos. Graças a isso se tornou conhecido e, hoje, é vereador em Santarém pelo PSB -e dedica o mandato à causa.
Na terça-feira, ele saiu de sua cidade durante a madrugada, de lancha pelo Amazonas, para instalar um comitê a favor do “sim” no município de Juriti, ao qual só se chega por rio.

Nos últimos cinco anos, Campos esteve 30 vezes em Brasília, em peregrinação pelos gabinetes dos deputados tentando aprovar a realização do plebiscito.

“Muitas vezes saí dessas audiências chorando, por achar que esse era um sonho impossível”, afirmou à Folha.
Ele dá contornos épicos à consulta que ocorrerá em dezembro.

“Está em jogo um sonho de 150 anos. Se não passar agora, meus filhos vão crescer com a missão de fazer esse Estado nascer”, diz.
Campos compara os defensores de Tapajós aos cabanos, que em 1935 tomaram o poder na então província do Grão-Pará.

“Mais uma vez não resta aos filhos do interior outra saída a não ser se rebelar contra a opressão e o abandono”, discursa.
Quando confrontado com dados que mostram que o Estado precisará de grandes aportes de recursos da União, o vereador afirma que Tapajós será “autossustentável” em pouco tempo e também “um Estado verde, que vai manter a floresta de pé” -diferentemente do Pará.

E evoca até questões culturais para justificar a separação: “O Pará tem o carimbó, nós temos o sairé como música típica. Até a santa do nosso Círio é diferente: em Belém é Nazaré. Aqui, Conceição.” (VERA MAGALHÃES)

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3. Entrevista com o professor Manuel Dutra
“O que o Pará não quer é perder Carajás”, diz professor

Manuel Dutra, autor de tese sobre Tapajós, afirma que, qualquer que seja o resultado do plebiscito, as consequências serão graves

DA ENVIADA A SANTARÉM (PA)

A radicalização do debate sobre a divisão do Pará pode levar ao esgarçamento das relações entre as três regiões do Estado, qualquer que seja o resultado do plebiscito.

A avaliação é do jornalista e professor-doutor da Universidade Federal do Pará Manuel Dutra, autor de um livro e de uma tese de doutorado sobre separatismo e a criação do Estado de Tapajós.

“Qualquer resultado vai ter consequências graves. O plebiscito é um fenômeno político que o Brasil deveria olhar com atenção”, diz.

Santareno radicado em Belém, ele apoia o “sim, mas devagar”, e discorda dos que veem a divisão como panaceia para todos os males. (VM)

Folha – Apesar de partidário do “sim”, o sr. tem recomendado cautela. Por quê?
Manuel Dutra – Sou a favor do “sim, mas devagar”. Desde que passou o plebiscito, aumentou o emocionalismo no debate. Não sei como vai ficar o tecido social se vencer o “não”. Qualquer resultado vai ter consequências graves. Será a primeira vez que se criará Estados por plebiscito. Até hoje foi na canetada.

O sr. vê problemas caso haja a separação?
Os projetos foram aprovados pleiteando uma área muito extensa. Tapajós, originalmente, não englobava a região do Xingu. Haverá uma capital, Santarém, tão distante quanto hoje. E falta tanto na região de Carajás quanto na de Tapajós líderes políticos à altura do desafio.

De onde nasce esse sentimento separatista?
A Amazônia não se reorganizou territorialmente após a Independência. Há Estados enormes e vazio de poder, graças à centralização. Isso leva a movimentos separatistas. No Tapajós, há o pleito de separação desde o século 19. Há um sentimento difuso de que a vida vai melhorar, mas se você perguntar como, ninguém sabe dizer.

Os novos Estados são viáveis economicamente?
Aqui se tem a sensação que basta virar Estado para que as coisas aconteçam. Não é assim. Mas há investimentos que o governo do Pará segura, como a rodovia Santarém-Cuiabá. Há um porto estratégico para escoar produção para a Europa. Quem é contra a divisão diz: “Vocês são pobres demais para se separar”. Aqui se diz que temos de nos separar porque somos pobres.

O caso de Carajás é o mesmo?
Não. Há uma elite em Marabá que veio de fora. Em pouco tempo, se transformou em uma região rica. Se fosse só Tapajós, não haveria resistência. O Pará não quer é perder Carajás

Fonte: Blog do Jeso

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