Vagas à venda nos Bombeiros

A prisão do subtenente bombeiro militar Emanuel Natalino de Souza Júnior, 38 anos, começou a desvendar, ontem, os crimes de falsificação de documentos e estelionato jamais vistos em uma corporação militar no Brasil. Como saldo, mais de R$ 700 mil teriam sido arrecadados de 117 pessoas que compraram uma vaga na instituição, mesmo depois da homolação do concurso para soldados do Corpo de Bombeiros Militar do Pará, em maio deste ano.

Preso, Emanuel Natalino resolveu contra-atacar. Disse em sua defesa que está sendo vítima de perseguição política por atuar no grupo de oficiais adversários do atual comandante. E que a fraude foi feita, na verdade, por outras pessoas sob a orientação do próprio comandante-geral, coronel Paulo Gerson. Tanto o diretor da Divisão de Investigações e Operações Especiais (Dioe), delegado Rogério Moraes, quanto o diretor da Diretoria de Polícia Especializada (DPE), delegado Neivaldo Silva, não acreditam na versão do estelionatário.

A prisão do subtenente aconteceu na manhã de ontem, na Polibom, a clínica do Corpo de Bombeiros. Emanuel tentava obter atestado médico para ampliar uma licença de saúde. A prisão foi resultado da investigação em parceria com a 2ª Seção do próprio Comando Geral, que começou a monitorar as primeiras suspeitas de estelionato ainda em abril.

No dia 23 de julho, as 117 pessoas arregimentadas pelo subtenente se apresentaram no Centro de Formação, Aperfeiçoamento e Especialização de Praças (CFAE) encaminhadas pelo próprio Emanuel. Deste total, 20 eram mulheres e 97 homens.

A Polícia Civil acredita que há pelo menos mais três envolvidos. Um, com mandado de prisão também decretado, é Emerson Nelson Gomes da Silva, que foi soldado da mesma turma de Emanuel Natalino, e que chegou a sargento do Corpo de Bombeiros, mas foi expulso a bem da disciplina por estelionato, em 21 de março de 2001. O subtenente Emanuel também chegou a responder a Inquérito Policial Militar por falsificação de contracheques e golpes aplicados na maior rede de magazine e supermercado do Pará. Mas as provas não foram conclusivas. E pelos afastamentos, acabou sendo alvo de um inquérito por deserção.

Hoje, o comandante geral do Corpo de Bombeiros entregará pessoalmente ao diretor da Dioe todas as cópias de extratos bancários de sua conta corrente no Banco do Estado do Pará, do período de janeiro a agosto deste ano. Ele quer afastar qualquer dúvida sobre sua conduta no caso. Ele disse que determinou a abertura imediata de inquérito para apuração das denúncias ainda em julho, mesmo em férias, através do subcomandante, coronel Luiz Cláudio Costa. E também encaminhou o teor dos documentos preliminares coletados pela Inteligência da corporação para as Promotorias de Direitos Constitucionais e Militar e à própria Dioe, através dos ofícios 182, 301 e 302/2009.
Vítimas pagavam de R$ 4 mil a R$ 18 mil por uma vaga de soldado

O delegado Rogério Moraes classificou o golpe aplicado por Emanuel como um '171' clássico. Das 117 pessoas, ele arregimentou 58 que moravam próximo à casa dele, no conjunto Catalina, outras da área do Mangueirão e algumas ainda no bairro do Bengui. Disse a todas que poderia ajudar a conseguir vagas como soldado no concurso já em curso mediante pagamento de valores que oscilaram entre R$ 4 mil e R$ 18 mil.

A Dioe conseguiu ouvir em depoimento 40 das vítimas do golpe. Todas afirmam que Emanuel oferecia a vaga e dava total garantia na obtenção do emprego, porque teria a cobertura do próprio comandante. Todas as etapas do concurso para soldados foram feitas pelo Instituto Movens, que cuidou da aplicação de provas e testes, apresentando à corporação apenas a lista final com os classificados.

O instituto, aliás, forneceu a relação dos 16.358 inscritos para que a investigação pudesse constatar que 41 dos 117 nem mesmo se inscreveram no concurso.

Emanuel Natalino começou a ser investigado logo depois do lançamento certame pelo Corpo de Bombeiros. O subtenente atuava na Diretoria de Ensino e Instrução sob a coordenação do coronel João Hilberto Figueiredo, que deve ser substituído da função. Outro fato curioso ocorrido 24 horas antes da prisão de Emanuel foi um relatório assinado pelo coronel Roberto da Silva Freitas, baseado em telefonema do próprio estelionatário, enfatizando a versão do envolvimento do comandante geral.

Em uma avaliação prévia do inquérito, o delegado Rogério Moraes também considera a possibilidade de indiciar todos os candidatos que compraram a vaga. Apesar de enganados, utilizaram meios ilícitos para entrar em uma instituição cujo único acesso se dá através de concurso público.

VÍTIMAS


Morador do conjunto Catalina, F. A. S. F, pagou R$ 6 mil pela vaga de soldado ao subtenente Emanuel Natalino Júnior. Como não tinha todo o valor, foi orientado pelo próprio militar a pedir demissão do trabalho e investir na estabilidade do emprego público. E assim o jovem fez.

A vítima era funcionária de uma concessionária do grupo Revemar. Como a indenização não deu para pagar o total devido, fez ainda empréstimo bancário. Comprou a farda de praça, fez exames médicos e recebeu a orientação para se apresentar no dia 23 de julho, às 7 horas, no CFAE.

O mesmo aconteceu com outro jovem que não quis se identificar. O subtenente sempre se comunicava com ele por telefone, usando vários números diferentes e pedia paciência. Para alguns, até chegou a assinar nota promissória com prazo de vencimento em 5 de dezembro deste ano. Para outros, a fim de provar que falava a verdade, exibia cópias de comprovantes de depósitos bancários em nome do comandante geral, cuja conta corrente no Banco do Brasil nunca existiu. O depósito em conta corrente no Banco do Estado do Pará ainda está sob investigação.

Outro fato curioso foi o registro de um Boletim de Ocorrência na Seccional da Sacramenta no dia 7 de agosto, às 15h26. Neste dia, Emanuel tentou fazer a mudança de residência, mas foi impedido por várias pessoas a quem vendeu vagas de soldado. Emerson, ex-sargento, provável comparsa e vizinho do subtenente, resolveu se antecipar. Disse ao escrivão que foi procurado por ele para praticar o golpe e que pela sua participação receberia R$ 50 mil. Como teria se negado, foi ameaçado com revólver calibre 38 pelo colega de turma.

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